Ponto de vista: Riki
O vermelho em seus olhos tingiu a superfície da água. As linhas hipnóticas do dōjutsu faziam as partículas no líquido se moverem, como se algo no fundo estivesse respondendo. Mas não como ele queria.
"Meu corpo já atingiu o ideal...", murmurou ele, com os olhos fixos no reflexo trêmulo na água. "Meus músculos, minha velocidade, minha precisão. O controle dos chakras já é uma extensão dos meus pensamentos, minhas reservas crescem a cada dia... E ainda... nada."
Ele cerrou os punhos. A água vibrou sob sua presença, como se tentasse responder. Mas o sangue... o sangue ali, não obedeceu.
"O Ketsuryūgan responde à vontade, sem selos de mão, sem jutsu. Apenas... comando direto. Como se o sangue reconhecesse seu mestre, mas por quê? Por que ainda sou um estranho para ele?"
Ele fechou os olhos por um momento. Respirou fundo.
"Talvez... talvez eu esteja usando força demais. Ou tentando racionalizar o que deveria ser instintivo."
Uma gota de suor escorreu por sua têmpora. Ou talvez fosse uma lágrima. O que importava era que o olho o encarava através do reflexo, um lembrete de que o poder que ele carregava era mais antigo do que ele, mais cruel do que qualquer outra herança.
"Eu sei que posso." Sua voz era agora uma promessa ao vazio. "E se eu não souber como... então eu aprenderei. Mesmo que eu tenha que sangrar por isso."
Riki aproximou a palma da mão da água; as veias ao redor dos olhos latejaram e uma gota de sangue pingou do nariz, caindo na poça. Por um breve segundo, o sangue ali presente respondeu, subindo em espiral, formando uma linha fina que tremeu no ar antes de se dissipar.
Foi pouco, mas foi o suficiente.
A respiração de Riki se acalmou. Seus olhos perderam o brilho do dōjutsu, mas não a convicção.
À distância, Tekka observava sem se revelar. A visão do filho diante daquele pequeno milagre de sangue o fez recuar, não por medo.
Mas de algo mais profundo: a compreensão de que o garoto estava, de fato, caminhando em direção a algo que nem mesmo os Uchihas poderiam combater, e que o mundo shinobi não está preparado para enfrentar.
E o tempo deles estava se esgotando.
O sol já estava alto no céu, quase no zênite, lançando uma luz pálida sobre as encostas escuras do Vale do Inferno. O calor do treinamento ainda impregnava o corpo de Riki, agora novamente envolto no tecido úmido da camisa, grudado na pele pelo suor seco e pelos respingos de lama. Cada músculo pulsava, vibrando com o esforço da manhã.
Cada passo no caminho de volta era pesado, mas deliberado. O terreno irregular, coberto de pedras e raízes retorcidas, parecia conspirar contra qualquer distração, mas ele havia memorizado cada obstáculo ao longo do caminho. Não tropeçou. Não hesitou. Seus sentidos ainda estavam aguçados, mesmo com a fadiga incrustada em seus músculos.
Seu corpo clamava por descanso, mas sua mente não se aquietava.
Por que o sangue não responde? Se o Ketsuryūgan é movido pela vontade... o que estou perdendo? Determinação? Ódio? Medo?
A brisa fria do vale, mesmo ao meio-dia, batia em suas costas úmidas, fazendo-o tremer levemente. Seu estômago roncava em protesto, ele não comia desde a noite anterior. Mas o jejum fazia parte da disciplina; a fome mantinha a mente afiada, o foco brutal.
Logo ele avistou a casa de madeira e pedra, incrustada como um segredo nas rochas do vale. O lugar parecia mais uma fortaleza do que um lar, isolado. Hostil. Seguro. O refúgio da família Chinoike-Uchiha.
Riki subiu os últimos metros em silêncio, sentindo os músculos arderem sob o peso das pedras íngremes. Ao abrir a porta, foi recebido pelo aroma de arroz fresco e caldo quente. A mesa já estava posta — simples, mas precisa.
O som sutil de passos indicava que Akemi estava na cozinha. Tekka, provavelmente, ainda a observava de longe. Riki não disse nada.
Ele simplesmente caminhou até a pia e lavou o rosto. A água fria tocou as cicatrizes recentes em suas mãos e nós dos dedos, arrancando um suspiro abafado. Ele encarou o reflexo no balde de metal. Seus olhos castanhos escondiam o vermelho que ainda pulsava por trás deles. O Ketsuryūgan, mesmo inativo, parecia retribuir o olhar com um olhar crítico.
"Preciso me tornar alguém que o mundo tema… ou serei apenas mais um nome apagado pela história."
Ao se aproximar da mesa, sentou-se com a postura ereta. Não era apenas a fome que o movia, era a expectativa pelo que estava por vir, pelo que teria que fazer.
Ali, naquele breve momento entre o treinamento brutal e o próximo passo de seu plano, Riki se permitiu um gole de chá quente, enquanto o cheiro de comida flutuava pela casa, e por um momento, o mundo pareceu um pouco menos cruel.
Ponto de vista: Tekka
Depois que Riki voltou para casa, Tekka foi direto para o quarto, onde se sentou em uma mesa com o diário aberto.
"Areia coberta de sangue."
Acordei hoje depois de um sonho, um sonho em que vi um deserto escaldante. Não era o sol que o aquecia, mas o fogo da guerra. Três ninjas moviam-se confiantes pelas dunas, orgulhosos. O emblema de Kusa brilhava em seus protetores de testa.
O vento sussurrava uma canção macabra, abafada apenas por um som, não de passos, mas de madeira rangendo.
E então ele apareceu, um garoto ruivo, de constituição frágil, com olhos que raramente piscavam. Pensei que fosse um dos nossos, um membro do clã, mas não o reconheci. Se for um dos nossos, não vive no Vale do Inferno. Em seus olhos, havia uma frieza calculada, sem medo, sem raiva, sem compaixão.
— Um mestre das cordas invisíveis.
Os bonecos se moveram antes que os inimigos sequer percebessem. Mal conseguiam reagir. Um boneco, com lâminas escondidas nos pulsos, girou em alta velocidade e decepou o braço de um jōnin antes que um grito pudesse se formar. Outro, menor, saltou sobre o ombro de um inimigo e injetou veneno em sua espinha, paralisando o corpo que desabou.
A areia se agitava com o sangue jorrando dos cadáveres. O garoto recuou dois passos, girou os dedos como um maestro. Os corpos dos inimigos agora eram pedaços desmontados. Seus olhos até pareciam brilhar com os ossos quebrados, articulações dilaceradas e tecidos separados com precisão cirúrgica.
Seu olhar não tremeu, ele olhou para o sangue como um pintor olha para a tinta. Com um estalar de dedos, os bonecos se retraíram.
A cena mudou. Agora, cercado pelo silêncio, ele começou a montar outra marionete, uma nova obra, uma nova vítima. Ele imortalizou suas vítimas no campo de batalha como marionetes, usando-as em combate.
— Um artista do macabro e do grotesco. A vila o aclamava como um herói, mas ele nem se dava ao trabalho de comparecer às celebrações. No fundo, ele nem era mais humano.
As lendas dirão que seus fantoches sangram, que suas armas são mais silenciosas que a morte...
Ele será chamado de Sasori da Areia Vermelha, mas eu o conheço. Eu o vi quando ele ainda era criança... A guerra não o criou, a guerra apenas lhe deu um palco. E ele se apresentou bem.
— Então ele viu Sasori da Areia Vermelha. Tekka murmurou enquanto começava a ler outra página.
Tekka, mesmo abalado pelo conteúdo do diário, continuou lendo a próxima página...